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QUANDO A VERDADE CONFRONTA: Críticas, rejeição e o chamado à unidade no corpo de Cristo.

“Se for possível, quanto depender de vós, tende paz com todos os homens.”
Romanos 12:18

Um dos grandes desafios da caminhada cristã surge quando, após muitos anos servindo fielmente em uma determinada igreja, o Senhor abre os olhos espirituais de alguém, permitindo enxergar distorções doutrinárias, práticas legalistas ou ausências da centralidade do evangelho.

Essa pessoa ou familiar, movida por oração e convicção, decide trilhar um novo caminho, buscando uma igreja que pregue fielmente as Escrituras e viva com profundidade o evangelho da graça. No entanto, esse passo muitas vezes desencadeia uma dolorosa ruptura com a antiga comunidade, marcada por julgamentos, rejeição e até acusações de apostasia.

É comum que igrejas que se consideram "detentoras da verdade" olhem para seus ex-membros com desdém ou desprezo, tratando-os como desviados ou infiéis. O vínculo outrora fraterno é quebrado. A amizade é cortada. Os nomes são ignorados. Os relacionamentos são congelados.

A crítica aos que saem não é teológica — é pessoal. E, de forma triste e irônica, tudo isso é feito em nome de Deus, com um zelo que mais fere do que edifica. Por outro lado, os que permanecem acabam reproduzindo esse mesmo padrão de julgamento e controle, muitas vezes por medo, tradição ou falta de entendimento bíblico.

Enquanto isso, os que saíram, embora livres da estrutura opressora, carregam traumas, dúvidas e uma sensação de isolamento, como se tivessem rompido com o próprio Deus — quando, na verdade, estão apenas buscando conhecê-lo de forma mais verdadeira e bíblica.

Mas, ao vivenciarem o frescor da Palavra viva, ao se depararem com a simplicidade e profundidade do verdadeiro evangelho, sentem um desejo genuíno de compartilhar essa nova perspectiva com aqueles que ficaram.

No entanto, esse compartilhar é muitas vezes entendido como ataque, afronta ou indireta. Ainda que não haja intenção de inflamar ou provocar, a crítica — mesmo feita com amor — gera resistência, porque confronta estruturas, mexe com certezas e expõe um incômodo que muitos preferem não enfrentar.

Diante disso, qual deve ser a postura bíblica para ambos os lados? Para os ex-membros, o apóstolo Paulo nos lembra: "Mas, seguindo a verdade em amor, cresçamos em tudo naquele que é a cabeça, Cristo" Efésios 4:15.

A crítica pode ter lugar, sim — especialmente quando o erro fere a verdade do evangelho — mas precisa vir temperada com graça, sem arrogância, sem espírito de superioridade.

Devemos lembrar que, um dia, nós também estivemos lá. E que, pela misericórdia de Deus, nossos olhos foram abertos. Não somos melhores, apenas alcançados pela luz. Por isso, toda palavra deve ter por objetivo restaurar, não humilhar; esclarecer, não agredir.

"O servo do Senhor não deve andar metido em brigas, mas deve ser brando para com todos, apto para ensinar, paciente, disciplinando com mansidão os que se opõem a ele, na expectativa de que Deus lhes conceda não só o arrependimento para conhecerem a verdade, mas também o retorno à sensatez, a fim de que se livrem dos laços do diabo, que os prendeu para fazerem o que ele quer" 2 Timóteo 2:24-26.

Já para aqueles que ficaram, o chamado é para não endurecer o coração, mas examinar tudo à luz da Palavra. O próprio Senhor Jesus afirmou: “Conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará” João 8:32.

Rejeitar uma crítica apenas por quem a trouxe — e não pelo conteúdo que carrega — é agir com orgulho, não com discernimento. Nem todo alerta é rebeldia. Nem toda saída é apostasia.

É preciso discernir os frutos, e não apenas preservar tradições. O apóstolo Paulo elogiava os crentes de Bereia por conferirem nas Escrituras se o que ouviam era verdadeiro (Atos 17:11). Por que não fazer o mesmo?

A ambos os lados, o Senhor nos chama à unidade no corpo de Cristo. Não unidade forçada, baseada em estruturas humanas, mas unidade gerada pelo Espírito, que se manifesta em humildade, verdade e amor.

Jesus orou e pediu a fim de que todos fossem um. "E como tu, ó Pai, estás em mim e eu em ti, também eles estejam em nós, para que o mundo creia que tu me enviaste" João 17:21. Como o mundo crerá, se nos digladiamos? Como viveremos o evangelho, se não conseguimos lidar com as diferenças sem desprezar o outro?

Nem todo confronto é ofensivo. Nem toda crítica é destrutiva. A verdade liberta, mas também fere antes de curar. A maturidade cristã exige que saibamos ouvir com o coração aberto, corrigir com brandura e, acima de tudo, amar até quando nos sentimos incompreendidos.

Se você já saiu de um contexto religioso e hoje experimenta a graça do evangelho, lembre-se de onde Deus te tirou — e estenda a mão com amor aos que ainda estão lá.

E se você está ouvindo críticas de quem saiu, não se ofenda imediatamente — pergunte a Deus se Ele não está, por meio delas, chamando você também para mais perto de Sua verdade. "Examinai todas as coisas, retenham o que é bom" 1 Tessalonicenses 5:21.

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